Sábado, 03 de Novembro de 2007
Querido diário,
Esta é a primeira vez que escrevo
em suas páginas. Ao contrário de Deus, escreverei errado por linhas retas. É estranho
expor tudo o que se passa dentro do meu coração em letras
cursivas. Mais estranho ainda é não ter alguém para me ouvir, sendo necessário
um desabafo sobre um objeto inanimado. Mas é a minha maneira de escapar, de me refugiar de uma realidade que está ao meu redor e que insisto em fingir que está
do outro lado dos muros.
Preciso confessar que, às vezes, forço um choro na esperança de que uma lágrima represente a minha tristeza. Necessito
de uma prova, uma prova palpável de que todo esse rancor seja real e não algo
da minha inútil memória. Meus amigos, se é que posso chamá-los assim, têm seus
próprios problemas e não suportam carregar um peso a mais. Por isso, guardo
dentro de mim minhas inúmeras indagações. Não seria justo despejá-las sobre
eles, seria? Eles parecem não pensar o mesmo, pois sempre os ouvi e nunca houve reclamações da minha parte. Acho, inclusive, que ouvi-los faz com que eu me esqueça dos meus demônios particulares.
Recentemente, revi através de uma
foto um colega que, mesmo distante, se fazia presente. Senti saudades. Mas houve
um desentendimento entre nós e meu orgulho é tão grande que não sou capaz de
pedir desculpas. Tenho a sensação de que vou me sentir subtraída, insignificante. Tudo não passa de egoísmo, eu sei. Afinal, sou humana e essa característica tem sido
minha desculpa para não voltar atrás.
Também quero falar dos amores,
querido diário. Às vezes sinto que o mundo se esqueceu de mim. Por trás do meu
sorriso há muito mais do que ele possa aparentar. É querer muito que alguém me
enxergue como verdadeiramente sou? Tenho tanto a oferecer a um verdadeiro amor.
Há tantos poemas que eu gostaria de ler, tantos cafés-da-manhã que eu gostaria
de passar tomando um chocolate quente e comendo torradas e também há abraços e
beijos que, carinhosamente, eu adoraria oferecer. Porém, tudo isso parece tão
distante de mim.
Estou envelhecendo. Minhas mãos
já não são as mesmas e percebo isso ao observá-las no momento em que escrevo. O
tempo está correndo e me pergunto: o que será de mim? Tenho medo do futuro. O que
ele me reserva é uma surpresa e eu detesto surpresas. Normalmente, nunca são
boas. Peço desculpas por escrever palavras tão lúgubres. Queria mesmo poder
contar experiências melhores, mais dóceis. Percebe? Até contigo eu me
preocupo, Sr. Diário.
No entanto, por hoje é só. Pode “respirar”
agora. Prometo não fazer deste pequeno livro um conto de dramas. Já me encontro
em um estágio de incredulidade tão avançado que, acredite, não vou te torturar por tanto tempo. Tudo tem um fim. Como eu sempre digo: não há
inferno que dure para sempre. O meu está prestes a terminar. Ainda assim,
obrigada por me receber em suas linhas.
De sua grata e não tão
feliz,
Lílian.
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